Se os governantes tiverem de fato vontade política, como propalam, para levarem a efeito o mais rigoroso possível controle da corrupção, uma das principais medidas que haverão de adotar será sem dúvida a busca da profissionalização das carreiras de servidores públicos, que pressupõe a eliminação de contratações pelo Estado de servidores sem concurso público.
Indispensável também a moralização dos concursos públicos, de modo a garantir amplo e isonômico acesso a todos os interessados, o correto e justo exame de mérito e qualificação dos candidatos e o preenchimento dos requisitos exigidos para a função, o que só se pode conseguir por meio da divulgação, já no primeiro edital, de vantagens e desvantagens decorrentes do cargo e do respectivo plano de carreira, a fim de atrair a concorrência de todos os que possuírem vocação e comprovada habilitação.
É que quem ingressa no serviço público pela porta dos fundos, sem concurso público ou em concurso inspirado na fraude, já pelo vício de origem, demonstra não ter estofo moral suficiente para suportar os ônus do cargo e terá grande possibilidade de sair pela mesma porta em razão de práticas ilegais e abusivas.
Ainda de início é necessário considerar que o concurso público deve ser realizado diretamente pelo ente público interessado em contratar, não havendo lugar para a ilegítima contratação de empresas para a sua realização.
De fato, ao delegar a realização do concurso público a uma empresa, o governante acaba por distorcer o regime republicano e macular um dos mais importantes pilares do concurso, que é a prevalência do interesse público sobre o privado. Empresas buscarão sempre as vantagens econômicas como principal objetivo dos sócios e, portanto, farão prevalecer o interesse individual sobre o coletivo. Não é sem motivo que as prefeituras municipais que adotam esse ilegítimo procedimento apresentam maior incidência de fraudes nos concursos públicos.
Ao Estado interessa a contratação dos mais honestos e melhores profissionais, ou seja, dos que maiores vantagens oferecem ao interesse público. Daí a necessidade de prévio, severo e cuidadoso concurso público.
No regime republicano, só a lei pode criar cargos públicos e estes só podem ser preenchidos por concurso público, sob pena de ofensa ao critério da igualdade de acesso a todos os cidadãos e aos princípios impostos constitucionalmente à administração pública, como os da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência (CF, art.5º, 37, I, II, XXI e 206, V).
Não se cuida, aliás, de norma de interesse exclusivamente interno, na medida em que, signatário da Declaração Universal dos Direitos Humanos, deve o país dar ao preceito a distinção de norma de Direito Internacional: Toda pessoa tem direito de acesso, em condições de igualdade, às funções públicas de seu país (Declaração Universal dos Direitos Humanos, Assembleia Geral das Nações Unidades, 1948, art.XXI, 2).
Por fim, forçoso compreender que processo seletivo simplificado não se confunde com concurso público. O primeiro é comum inclusive nas empresas privadas, que chamam candidatos, fazendo-os passar por uma entrevista ou uma prova para a constatação de preenchimento de requisitos subjetivos impostos pelo empresário. Os candidatos comparecem e são escolhidos pelas indicações e referências, pelas aparências ou pelo humor do entrevistador. Selecionados com esse grau maior ou menor do rigor subjetivo do empregador, acabam sendo contratados diretamente. Já o concurso público funda-se rigorosamente nos princípios do amplo acesso, larga publicidade através de minuciosos editais, igualdade de condições entre os candidatos, provas objetivas pertinentes às exigências do cargo e banca examinadora notoriamente qualificada, previamente conhecida e isenta de suspeição ou vinculação com candidatos, além de outros filtros destinados à detecção de fraudes.
O grande empecilho é o fato de os governantes não desejarem se submeter à ordem jurídica no que se refere à contratação de pessoas. Como é mais do que evidente, querem continuar contratando amigos, parentes, correligionários e cabos eleitorais ou, nos casos mais grave, lideres de organizações criminosas. Por isso recusam renitentemente a aplicação dos princípios do concurso público, inclusive no âmbito das licitações. Essa ilicitude, a propósito, vem se transformando no mais importante fator de aumento da corrupção que, como é notório, já desmontou quase completamente o Estado brasileiro, hoje também por isso ausente em todas as funções próprias da administração pública.
Fonte: Consultor Jurídico
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